Minha escola privilegia as provas. Como posso trabalhar com avaliação formativa?
- SABELETRAS
- 20 de dez. de 2024
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Embora a nossa Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB (Lei 9394, de 20/12/1996) já esteja se aproximando de seus 30 anos, ainda é muito grande o número de escolas que retém hábitos avaliativos do passado, entre eles a preferência por provas de grande peso na avaliação dos estudantes. Ao mesmo tempo, muitos professores ouviram repetidamente em sua formação que a avaliação deve ser um processo formativo, contínuo e cumulativo, como diz a referida Lei.
Diante desse cenário, não surpreende que surjam perguntas sobre como trabalhar com avaliação formativa. Como se não bastasse, as rotinas docentes são muito pesadas, o que torna a avaliação por meio de provas muito mais atrativa do que o esforço aparentemente infindável para se praticar a avaliação formativa. Nesse texto, vamos desatar alguns nós dessa questão.
Vamos começar questionando, por um lado, a relação entre atividades e tarefas escolares e avaliação formativa, e, por outro, entre provas e avaliação somativa.
A LDB e autores importantes do campo da Educação, como Lucchesi e Hoffman, dentre muitos outros, questionam a prática dos exames escolares, principalmente aqueles praticados no passado ao final dos períodos escolares. Esses exames finais, classificatórios, eram definitivos para a decisão de aprovar e reter alunos. É interessante, porém, observar que a própria LDB não descarta o uso de provas. O art. 24, incisos I e V, declara:
"I - z carga horária anual será de 800 (oitocentas) horas para o ensino fundamental e de
1.000 (mil) horas para o ensino médio, distribuídas por, no mínimo, 200 (duzentos) dias de
efetivo trabalho escolar, excluído o tempo reservado aos exames finais, quando houver;
(Redação dada pela Lei nº 14.945, de 2024);
V - a verificação do rendimento escolar observará os seguintes critérios:
a) avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais;"
Portanto, o problema não se resume à simples existência de provas e exames, finais ou não. O que autores renomados do campo da avaliação e a legislação querem dizer é que as provas não devem ser o instrumento principal, menos ainda o único em um processo educacional. O fato é que provas e exames podem ser integradas a um processo de avaliação contínua, cumulativa e formativa. A questão é que esses instrumentos existam ao lado de outras formas de avaliar, o que inclui atividades e tarefas escolares, projetos, portfólios e até mesmo a observação dos estudantes pelos professores, dentre outras possibilidades. Portanto, o simples fato de sua escola utilizar provas não torna o seu processo somativo. Além disso, embora a própria LDB preveja a possibilidade de se trabalhar com provas finais, ainda é possível trabalhar com diversas provas, de peso menor, distribuídas ao longo do período escolar ao lado de outros instrumentos avaliativos, haja ou não exames finais.
A outra questão diz respeito a como as formas de avaliar que não sejam provas e exames são utilizadas no processo avaliativo. Em muitos contextos, as atividades são passadas aos estudantes e são simplesmente corrigidas (quando o são!) e devolvidas. Alcança-se, assim, o efeito cumulativo, mas este não passa de uma soma de pequenas notas que "diminuem o peso" das provas. Mas a avaliação formativa só será realizada de verdade se os estudantes receberem o devido feedback e tiverem a oportunidade de melhorar e até refazer sua produção. A avaliação formativa visa à aprendizagem, não à geração de notas. É preciso que o professor explore estratégias qualitativas de avaliação que promovam o desenvolvimento dos estudantes (mais a respeito adiante). Do contrário, os professores poderão estar simplesmente utilizando atividades, tarefas e outros instrumentos (que não a prova) de uma maneira somativa. Isto é: substituem-se as provas pelas atividades, mas se mantém a abordagem somativa.
Em resumo parcial, pode-se dizer o seguinte: tanto o uso de provas quanto o de outras formas de avaliar devem respeitar o princípio da avaliação formativa, contínua, cumulativa e qualitativa - mesmo que também sejam produzidas notas numéricas ou de conceito em conformidade com as exigências do sistema escolar.
Para além da relação entre a modalidade formativa ou somativa e os respectivos instrumentos, existe um conjunto de questões importantes que merecem atenção. A resposta essas perguntas podem clarear o tema. São elas:
Quem deve realizar avaliação formativa?
Quando e onde a avaliação formativa pode ser realizada?
Como a avaliação formativa pode ser desenvolvida?
A resposta à primeira pergunta é: tanto os professores quanto os estudantes.
Não apenas os professores podem realizar a avaliação formativa. Os estudantes podem praticar a autoavaliação e a avaliação por pares, com a orientação dos professores. De fato, essa forma de trabalhar pode ser uma ganho excepcional já que, conduzida da forma adequada, torna os estudantes mais conscientes, responsáveis, respeitosos, parceiros e empáticos. Promove as relações sociais, a interação e a colaboração. Por fim, reduz parte da carga de trabalho do professor.
Quando e onde a avaliação formativa pode ser realizada? Tanto em sala de aula quanto em casa. Sim, a sala de aula não é simplesmente um lugar para despejar conteúdos, mas um espaço de reflexão e colaboração que promove a aprendizagem. Um trabalho bem conduzido em sala de aula pode contribuir para que os estudantes fiquem mais à vontade para fazer autoavaliação das suas tarefas de casa. Para isso acontecer, o professor deve reservar tempo para ensinar os estudantes como fazer a autoavaliação e a avaliação por pares, ou grupos.
Mas, como a avaliação formativa pode ser desenvolvida? É preciso tornar claro os critérios e discuti-los com os estudantes. Nesse sentido, pode ser interessante utilizar roteiros de avaliação, checklists e rubricas. Os mesmos instrumentos podem ser utilizados pelos professores, estudantes em trabalho em grupo, em trabalho em pares ou individualmente. Na verdade, esses instrumentos deverão ser mais adequados para as tarefas do que para as pessoas. Por exemplo, a avaliação de uma apresentação oral vai possivelmente exigir o uso de instrumentos diferentes da avaliação de produções textuais. Um projeto para se fazer um jornal, livro, rádio escolar ou vídeos será avaliado de forma diferente de um projeto composto de relatórios escritos em que os estudantes descrevem um problema ambiental, social etc. Se todos fizerem uso dos mesmos instrumentos, os critérios serão mais bem conhecidos e isso promoverá tanto a aprendizagem como o desempenho na avaliação. Mas como essas atividades podem ser integradas em um calendário repleto de provas?
Um caminho é integrar essas atividades avaliativas no cotidiano das aulas. Nesse caso, os estudantes avaliam seus colegas e a si mesmos de forma regular, nas atividades diárias. Outro caminho é reservar regularmente aulas em diferentes momentos do semestre para promover um trabalho de reflexão sobre o que se estudou nas últimas aulas. Os estudantes podem retomar suas produções e a de seus colegas e discuti-las entre si, tendo no professor uma referência orientadora.
Finalmente, o professor de forma consciente poderá promover a flexibilização dos métodos avaliativos em sua escola, sendo uma voz a favor da mudança. Nessa busca, poderá encontrar resistências, discordâncias e não alcançar esse objetivo. Mesmo assim, poderá integrar as práticas avaliativas em seu próprio ensino e permitir que os resultados incentivem sua equipe a também adotá-las.
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